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Homenagem a Nikos Zachariadis, em Surgut, na Rússia
Surgut, 7 de setembro de 2014
Estamos hoje aqui, com todo o respeito e emoção, no lugar onde Nikos Zachariadis viveu durante muitos anos, como um exilado, expulso do KKE, com base em acusações graves para alguém que foi Secretário-geral do CC durante 25 anos. No lugar onde a sua longa vida - preenchida com lutas históricas, sem hesitações e dedicada aos direitos da classe operária e dos trabalhadores em geral - terminou dolorosamente, em 1 de agosto de 1973. No entanto, desde 2011 - data da decisão para a sua reabilitação e fim da suspeição - que não suporta mais o fardo de qualquer penalização; pois em 2011, não só foi reabilitado como membro do partido, mas também no cargo de SG do CC do KKE, livre das acusações caluniosas e infundadas.
Estamos aqui para lembrar a nós próprios que, há 3 anos, a Conferência Nacional do KKE - depois de uma discussão em que participaram os membros do partido e em que ouvimos a opinião de amigos e apoiantes, em reuniões públicas - chegou a uma decisão, com a esmagadora maioria dos votos. Foi uma decisão que muitas pessoas esperavam há muitos anos, incluindo nós: a decisão de reabilitar Nikos Zachariadis, conforme já observamos.
Esta decisão foi o fruto de muitos anos de pesquisa histórica coletiva, do estudo de todos os arquivos históricos que temos à nossa disposição. Claro que isto não elimina a nossa tristeza pelo facto de Nikos Zachariadis ter permanecido no exílio durante muitos anos, aqui, em Surgut, isolado dos seus camaradas, sem nenhuma tarefa atribuída, sem poder dar uma contribuição ao KKE. Contudo, isto mitiga tal injustiça.
Nesta terra, lembramos ainda mais intensamente como ele insistiu em dizer que as acusações eram injustas e politicamente erradas. Podemos compreender a sua profunda dor, a dor mais insuportável que um comunista pode sentir. O inimigo de classe torna-te inflexível, enfurece-te, atenta-te, mesmo quando estás a sofrer nas suas intoleráveis câmaras de tortura. Mas a dor psicológica, quando o partido que amavas, que honravas e que te honrava é injusto contigo, não pode ser comparada a qualquer dor física.
No entanto, Nikos Zachariadis teve a consciência e a coragem para acreditar no KKE, no socialismo científico e na pátria socialista, até ao fim da sua vida. Ele teve uma linha de conduta: nenhum ato por parte da pessoa que tinha sido tratada injustamente; não deve haver nenhum espaço para ataques contra o partido, o comunismo, a luta pelo socialismo.
As suas últimas palavras foram extremamente relevantes:
"O KKE foi e continua a ser o meu partido e ninguém o pode atacar e manchar usando o meu nome. [...] O KKE passou por muitos tumultos e tempestades; no entanto, ninguém conseguiu desenraizá-lo, porque isso significaria o desenraizar das próprias pessoas. (...) Estou a escrever esta carta para calar a boca daqueles que agora começam a gritar".
Todos conhecemos o curso da vida de Nikos Zachariadis. Além do respeito para com o tempo e, principalmente, pela razão de estarmos aqui, gostaria de, em nome do CC, me limitar a algumas das muitas e importantes questões que existem para que possamos explicar por que a sua reabilitação veio tarde e por que foi reabilitado. A coisa mais importante para nós é não esquecer as conclusões coletivas deste drama histórico do partido.
A sua reabilitação foi, de facto, adiada; todavia, durante muitos anos, especialmente depois de 1973 e 1974, quando certas coisas mudaram no partido, a postura da liderança do partido e de muitos dos seus membros para com Zachariadis foi na prática diferente.
A liderança do partido depois de 1973 teve uma postura diferente para com Nikos Zachariadis; entendeu que o processo de reabilitação devia começar pelo exame coletivo do período histórico que lhe diz respeito e não apenas por uma figura isolada, mas sim pelo Secretariado do CC do KKE.
Depois de 1974, quando o partido conquistou o direito à atividade legal, alguns momentos importantes da atividade de Nikos Zachariadis foram destacados, especialmente durante a ocupação, no quadro da tentativa do partido, após 27 anos de ilegalidade, exigir o respeito pela resistência nacional, que foi perseguida na Grécia, depois da 2.a Guerra Mundial. Assim, pôde ser reconhecida a contribuição de militantes conhecidos e desconhecidos. Estes militantes, que contribuíram para estabelecer o papel de vanguarda do partido, foram a principal fonte dos sacrifícios gregos na 2 a Guerra Mundial.
Temos presente que, num período que era difícil para o partido e o movimento comunista internacional, 1991, quando todos denunciavam o socialismo-comunismo, quando partidos comunistas eram ilegalizados de forma sumária, quando outros se autoliquidavam, o KKE tomou a iniciativa de transportar os seus restos mortais para a Grécia, a partir de Surgut, para uma permanente sepultura em Atenas.
É claro que ainda há questões e perguntas não respondidas e aspectos desconhecidos em redor do caso de Nikos Zachariadis, que levaram à sua expulsão e exílio político.
Começámos esse esforço depois de 1991. Deixámos claro desde o primeiro momento que o exame do caso de Zachariadis seria realizado de uma forma que, de um ponto de vista histórico, não poderia ser contestada - não seria uma posição sentimental nem motivada por conveniência política e não seria uma reabilitação só porque algumas pessoas estavam a pressionar nesse sentido; seria uma reabilitação totalmente ligada à história do partido, tal como a vida de Zachariadis também foi totalmente ligada ao KKE e ao Movimento Comunista Internacional.
O Ensaio sobre a História do KKE, vol. 2, que respeita ao período 1949-1968, faz a seguinte referência: "A pesquisa histórica deve examinar a personalidade e liderança de N. Zachariadis e a formação da estratégia e do funcionamento do KKE nas condições da sua época. É anticientífico separar da investigação as condições históricas relativas ao desenvolvimento e maturação do KKE, bem como as condições do desenvolvimento e maturação de N. Zachariadis como um líder comunista".
Examinando o caso de Nikos Zachariadis, soubemos desde o início que tínhamos de lidar com um problema: a separação de vários comunistas ou ex-comunistas entre aqueles que o admiravam e aqueles que o odiavam, ou, em qualquer caso, diziam que ele teve um papel prejudicial. Rejeitámos esta separação porque não era científica, objetiva. Escondia muitas questões substanciais e era, acima de tudo, superficial.
Ainda hoje essa separação sobrevive e é reproduzida, principalmente, por historiadores mais recentes que através de seu trabalho histórico apoiam o sistema capitalista. Além disso, há outros que ignoram os factos históricos específicos e situações específicas, atuam de uma forma metafísica e não têm em conta que os desenvolvimentos contemporâneos têm raízes no passado.
Mas mais ainda. Há hipócritas admiradores de Zachariadis que, deliberadamente, abordam a sua contribuição de forma seletiva. Escolhem uma frase, uma secção de um seu discurso, para justificar os seus próprios compromissos, apresentando escolhas de Nikos Zachariadis que, em última análise, não eram escolhas pessoais, mas sim escolhas coletivas e, de facto, também estavam ligadas às escolhas estratégicas do movimento comunista internacional. Outros usam o trágico caso de Nikos Zachariadis para atacar o socialismo e proclamar que esta luta é fútil e inútil, que é melhor ser um comunista amador no capitalismo.
Na verdade, algumas pessoas afirmam - umas deliberada e conscientemente e outras por que estudam em profundidade os factos históricos -, que Zachariadis foi expulso por concorrentes ao cargo de secretário, pois querem arguir que as mesmas coisas, isto é, a luta para ver quem fica na cabeceira da mesa, acontecem, alegadamente, em todos partidos.
Porém, esquecem que a "cadeira", no KKE, está cheia de espinhos; que o inimigo tenta minar esta posição; que a vida dos quadros do KKE não tem nada a ver com relações públicas; que não é apenas bonita, mas, também, incrivelmente difícil - não só em períodos difíceis, mas também em períodos que são considerados relativamente mais calmos.
Nós não seguimos o caminho, quer de aniquilar politicamente Zachariadis - um caminho que foi escolhido no passado e que foi tão injusto para ele, até à sua trágica morte - quer o caminho da idealização. Além disso, não temos o direito de idealizar o percurso histórico do KKE, independentemente do facto de nunca ter traído ou se ter submetido, e independentemente de dezenas de milhares de pessoas se terem sacrificado pela luta dos trabalhadores e do povo e continuarem a fazê-lo enquanto for necessário.
A Conferência Nacional do KKE avaliou positivamente a contribuição de N. Zachariadis como um líder comunista e reabilitou-o, rejeitando a acusação caluniosa que o acompanhou por muitos anos, os argumentos oportunistas de direita do 6.° Plenário alargado (1956) e outros Plenários do CC, assim como os Encontros de 1964 e 1967.
A maior contribuição de N. Zachariadis reside precisamente naquilo que os inimigos e amigos desonestos, os oportunistas, contestam: na fundação e atividade do Exército Democrático da Grécia (DSE), o mais importante acontecimento na história da luta de classes na Grécia, no século 20.
Esta escolha não foi arbitrária, mas necessária. O inimigo impôs esta escolha logo que decidiu eliminar um a um todos os comunistas da Grécia, no momento em que as forças imperialistas que contribuíram para a derrota do eixo fascista alemão organizaram o contra-ataque, usando a guerra fria e quente, na Europa e em todo o mundo. Após a Segunda Guerra Mundial, houve dezenas de guerras regionais, até aos dias de hoje. Em todos os casos o culpado é só um: o imperialismo.
A luta do DSE não estava apenas relacionada com as agudas contradições na Grécia. Por outro lado, não foi importada. A luta surgiu a partir dessas contradições e, ao mesmo tempo, era uma luta internacionalista, pois, além da classe burguesa grega, também visava o seu novo aliado imperialista, os EUA. Foi uma luta que criou um legado revolucionário de grande valor.
Nikos Zachariadis desenvolveu um significativo esforço nesta luta, para ter em conta o caráter socialista da revolução na Grécia. A contribuição de N. Zachariadis inclui a sua inabalável postura em relação à criação e ao desenvolvimento de organizações partidárias do KKE na Grécia, independentemente das condições. Este compromisso não caiu por terra, apesar das tremendas medidas repressivas do Estado burguês. Ele não considerou a construção do partido como uma raison d'être4, mas como um factor que, juntamente com a vigilância revolucionária e as medidas para proteger o KKE, contribuiria para o desenvolvimento de todas as possibilidades, mesmo da mais ínfima, para abrir, pelo menos, uma pequena brecha à atividade legal do KKE, à sua atividade relativa aos problemas do povo. O Ensaio sobre a História do KKE faz uma referência especial à sua contribuição na construção de organizações partidárias sob todas as condições.
Em particular, há uma referência para a 3.a Conferência do KKE, em 10-14 de outubro de 1950.
Infelizmente, o esforço dos quadros do partido, liderado por Zachariadis, para unir as suas fileiras, para alcançar a maior militância possível e não se submeter à pressão do inimigo, foi caraterizado como um "anormal regime interno do partido" por um conjunto de quadros que alegou que Zachariadis foi o responsável. Este foi um momento crucial que levou ao problema dos bem conhecidos acontecimentos em Tashkent, nos sexto e sétimo Plenários, de 1956 e 1957, onde N. Zachariadis foi acusado de antissovietismo, uma acusação 100% infundada. Esta acusação, entre outras também infundadas, era conveniente para os oportunistas, que se apresentavam apenas como adversários do Zachariadis, tornando-lhe difícil tratar de assuntos, em território soviético, que diziam respeito, acima de tudo, ao KKE e ao movimento grego, enquanto, ao mesmo tempo, milhares de membros e quadros do partido e crianças pequenas estavam a aproveitar a hospitalidade e a solidariedade sincera do povo soviético e participavam na construção socialista.
Nós, os comunistas gregos, aprendemos todos estes anos com o nosso partido, para falar sem rodeios, também a fazer críticas a outros partidos comunistas. Acima de tudo, aprendemos a reconhecer as nossas próprias responsabilidades e, depois disso, a criticar os fatores negativos a nível internacional, que sem dúvida desempenharam um papel nos acontecimentos analisados.
É bem sabido que as autoridades gregas entregaram Nikos Zachariadis aos alemães e que esteve detido em Dachau durante 4 anos. Por isso, não teve condições para acompanhar as escolhas e a estratégia do KKE durante a luta de libertação nacional e, daí, a subestimação da necessidade de ligar esta luta à transição para o socialismo. No entanto, a Conferência Nacional criticou Nikos Zachariadis pelo facto de que o esforço coletivo para avaliar os erros deveria ter começado após o seu regresso à Grécia e a libertação do país. Não é possível continuar um rumo ou alterá-lo, se considerarmos isso necessário, sem tirar conclusões sobre o passado.
Não contestamos a explicação que, mais tarde, foi dada por Nikos Zachariadis, ou seja, que ele não falou sobre a linha política errada do partido, quando regressou à Grécia, porque não se queria apresentar a si próprio como sendo mais inteligente do que os outros e por que qualquer esforço para mudar abruptamente a estratégia do KKE podia ter levado a uma divisão no partido e na EAM5, pois o partido não estava preparado para aceitar esta reavaliação e a mudança de linha política, dado que outros partidos tinham procedido a escolhas semelhantes, na base das condições existentes nos seus países.
Em conclusão, Nikos Zachariadis deveria ter falado e argumentado em defesa dos seus pontos de vista. Isto não quer dizer que tivesse convencido definitivamente o partido, dado que a linha política do KKE incluía todas as contradições da estratégia do movimento comunista internacional. O facto da União Soviética estar a enfrentar dificuldades sem precedentes, tanto no interior do país, como nas suas relações internacionais, também contribuiu para a sua hesitação. No entanto, era necessário que ele tivesse feito esse esforço. Além disso, era um período em que o inimigo já tinha mostrado os dentes e havia mais evidências - e, acima de tudo, sinais de alerta tangíveis sobre como a situação se desenvolveria após a II Guerra Mundial. Tornou- se óbvio que o imperialismo iria proceder a um contra-ataque e que uma parte deste contra-ataque seria um esforço de pressão ideológica sem precedentes sobre os partidos comunistas e o movimento operário, a fim de os assimilar e deter a expansão do socialismo na Europa.
Em 1953, Nikos Zachariadis contribuiu para a formação de uma estratégia correta do partido: o Projeto de Programa aprovado pelo Plenário alargado do CC (12-14 de dezembro de 1953) estabeleceu, em detalhe, a estratégia do KKE. O Projeto de Programa determinou o caráter socialista da revolução na Grécia; contudo, reproduziu argumentos que não correspondiam às corretas conclusões delineadas.
Infelizmente, a dificuldade em interpretar o atraso da industrialização na Grécia e o seu impacto sobre a posição do país no sistema imperialista, atormentou o nosso partido durante muitos anos. Esta fraqueza estimulou outras, que culminaram na decisão de dissolver as organizações partidárias do KKE na Grécia, o que ocorreu após a expulsão de Zachariadis. Esta decisão teve uma influência negativa sobre a nossa actividade na Grécia, até aos dias de hoje.
Não nos referiremos a outros assuntos. Mencionámos algumas questões indicativas pelas quais Zachariadis enfrentou acusações injustas. Mas, mesmo que ele, pessoalmente, não tivesse conseguido contribuir para a prevenção de erros, na medida em que isto era difícil, devido a causas externas e internas, pelo menos, teria contribuído para uma luta que teria poupado muitos comunistas da Hidra de Lerna6 do oportunismo. O partido e o seu CC passaram por um percurso muito difícil, que levou muitos anos a estudar, bem como a restaurar o seu caráter revolucionário. Foi por isso que levámos tanto tempo para reabilitar Nikos Zachariadis, mas a sua reabilitação ocorreu com base em critérios objectivos.
A Conferência Nacional do Partido, que analisou o caso de Nikos Zachariadis, a um nível individual e no âmbito da responsabilidade coletiva, não foi além de 1968. Continuaremos com a análise do caso de Nikos Zachariadis até à sua morte, em 1973, no decurso da elaboração do terceiro volume do Ensaio sobre a História do KKE; sempre com base nos arquivos do partido, assim como doutros arquivos válidos, sempre na base de evidências, sem qualquer subjetivismo. Sendo certo que, independentemente de qualquer nova evidência que possa surgir do estudo do período até à sua morte, nada pode mudar a grande contribuição de Nikos Zachariadis e as lições a tirar da sua reabilitação.